Alumbramento
Luz:
olhos de certeza,
faróis de sorrisos navegantes.
Mar:
sorriso feito espuma
de ondas cantantes.
Ouço-te: crio castelos
de reencontros,
desperto
emoções esquecidas (porque
sorris).
Pés. Pele. Cor
Sensíveis os pés. Cores, não:
há beleza no que se diz branco,
há beleza no que se tem por negro.
Pés são estrutura, e pele, e
unhas.
e sentidos,
harmonia e reação.
Pés: tato e tesão.
Falando das coisas
Falar
das cores,
das dores, das flores.
Conclamar
luas, serenatas, ruas,
lágrimas tuas,
tuas pernas nuas.
Talvez eu falasse
do café da manhã, do sol
e do preço do álcool, do custo
das coisas no supermercado, sinal
fechado, mendigos, estacionamentos,
do preço do dólar, do cheiro
das ruas e do cheiro
do teu perfume entre os lençóis.
O que tem pro almoço,
o que trago da rua,
o que faço da grana
que não sobrou?
Quem
sabe se à noite
a gente se esvai
e sai por aí, sem rumo,
sem fumo, sem vela, sem tela,
sem tempo pra casa?
Que
pena! Não sei,
eu juro!,
não sei falar do cotidiano.
Só
aprendi a falar de amor.
Cantiga de louvar amiga
Para a poeta Sandra Falcone; fevereiro, 1999.
O fato de achar-me
em tantos,
um convite, o feriado em Santos.
As frases brotadas do peito,
um viver de poeta, o jeito.
A voz musicada em
meiga
(e falávamos de Veiga);
elegante em traje e saltos,
vem da Metrópole ao Planalto.
Quer flores, não
de um jardim,
mas as que brotem de mim.
Esparge lírios e incenso
e planta à volta amor imenso!
* * *
Talvez eu construa,
numa forma antiga,
uma flor-cantiga
de louvar a amiga.
L.deA., Sandra e José J. Veiga |
Um mar de verdes
águas
sob azul e alvas nuvens.
Um mar de ondas
ágeis,
assim o mar. Ágeis ondas ritmadas,
rompem-se no preâmbulo.
Correm léguas,
feito eu;
feito línguas, lambem praias.
E beijam a terra, na carícia que se estende.
Feito
um manto sobre a areia.
Até a alvorada
Mágoas, dores, insônias
— como não?
Bares, noites, infâmias
— por que não?
Dá-me
as mãos de carícias
e o beijo de amar-me
e não serei mais estranho.
Dá-me a voz de acalanto
e a paz da alvorada
e não serei mais tão triste.
Dá-me
os dias teus
e não seremos mais sós.
Poeta Luiz de Aquino
Falar comum
É
comum se falar de sorrisos,
de
mãos, de olhares.
É
comum se falar de encontros
e
desencontros
e é
comum se falar de amores
frustrados,
nascentes, silentes,
buscados,
emergentes, inocentes.
É
comum o encontro de olhares;
e o
brincar de sorrisos.
As
mãos,
entrelaçadas,
são
mais fáceis de encontrar
e te
dou minhas mãos para acariciares.
Dá-me
os teus olhos e deixa que eu brinque
com
teu sorriso.
Mais
tarde, quem sabe?, os pés
de nós
dois a tatear-se
dirão
melhor que nossas vozes.
da AGL.
A rosa
A
rosa, essa rosa que alguém colocou
no meu peito...
A rosa, essa rosa rosada,
puxada para o rubro tênue, rosa
choque talvez.
A
rosa, essa rosa que enfeita
e perfuma
a mão que me afaga o peito,
enfeita o carinho, realça o momento
em que chego tímido
propondo te amar.
O
tempo passou pelos meus dedos
e nasceram palavras, sistematicamente criadas
no rigor dos tipos.
As palavras ficaram assim, enfeitadas
em negro na alva quadratura do papel
-- mas as palavras não eram estas impressas
e eram palavras que forjei no vazio
miúdo e doído
entre vísceras que eu não sabia existirem.
Lá fora, gritam e correm pessoas
e são muitas pessoas
querendo buscar outros rumos e trocar pessoas
pois não há como acreditar e não se faz futuro
sem crença.
Essa gente não quer mais ser guiada:
lá fora, há mãos crispadas e punhos erguidos,
há gritos de ordem e os soldados também gritam
— mas os soldados gritam em silêncio,
não lhes é dado gritar com a boca aberta e a força dos pulmões.
Lá
fora há discursos inflamados e pequenas intenções
inconfessáveis.
E enchemos de silêncio nossa tarde
enquanto cremos mais nos
nossos corpos assim
tão comungados.
* * *
Poeta Luiz de Aquino
O gozo que te cala
É de
ver como dói
esperar por teus passos
no corredor.
É de ver a esperança
de teu rosto sorrindo
à porta entreaberta
até desfazer-se
no beijo sonhado.
Cada
peça de roupa
caindo silente
é pedaço das almas
gêmeas
que alimentam desejos
insatisfeitos
até que encontremos
no suor comum
orgasmos retidos
de todos os dias
do até agora.
É de
ver como gosto
de gostar do gozo
que te cala o pranto.
O sonho e o vento
Voei
meus anseios
nos ventos de março
que levam as águas
pra longe de nós.
Na
noite, o frio do vento
machuca-me as costas
e pede o abraço
do teu calor
antes que amanheça.
Poeta Luiz de Aquino
![]() |
Arte de Pádua, 1983 |
Nós, Poetas!
Repositórios de
insultos
e estímulos, ou de que mais apelidem
clamores de ouvintes,
de poetas,
de leitores.
Adormecemos em nós imagens novas,
palavras velhas,
excitações momentâneas, pedras
de se edificar o tempo
até porque o tempo
semente de suaves copas,
frondes grávidas de ternas sombras.
Somos seiva de
fartas florestas,
pastos de estelares insetos,
fontes de dessendentar noctívagos.
Poetas somos alma
eterna
e corpo vívido de encantar sereias,
domar demônios,
amansar angélicos fantasmas
de nossas não menos etéreas
fantasias do quotidiano.
(Talvez desvios das certezas falsas,
de condutas ditas certas.
Apesar dos dias).
Nega,
que bom! É sábado, é noite
Fechei o quiosque, não vendo mais nada
até o domingo virar segunda
outra vez.
Nega,
que bom que é você,
esse cheiro de flor, esse cheiro
meu Deus!, esse cheiro de amor
esse cheiro de fêmea
chamando meus beijos,
meus dedos, meus olhos,
tudo de meu nessa pele sua.
É
bom sermos nós.
Esta noite, Nega, a chuva refresca
e chove demais, de fazer corredeira,
entupir a sarjeta...
Nega!
Nega!
Nega, meu bem!
Acorda! Será que esta noite
eu durmo de novo
com saudade d'ocê?
Poeta Luiz de Aquino
Chapéu *
Era
escuro e fazia vento
enquanto o beijo
(eu amava).
A
esplanada tem píncaros
e grotas; artificiais
(faltava luz).
E
ventava, era escuro e eu;
benfazejo
de tanto beijo.
Úmidos
e quentes,
e ainda doces, os beijos
(vestiam renda e branco).
O
vento levou meu chapéu
claro e novo.
Era fundo o escuro…
Pedi
beijos mais;
voltei a sonhar e fui feliz
E o chapéu? Ah, era noite!
Luiz de Aquino, poeta.
Feitio de sorte ou morte
Magia mais forte é mandinga,
feitiço e feitio
de mudar a sorte.
Não há regular-se ante o tempo
nem inventar o amor insensível:
amor é poção de morte.
Ou de doer (quem não fenece
é poeta).
Poeta Luiz de Aquino
Começo
Um beijo molhado,
gostoso, suado,
melado, sonhado,
tardio esperado,
tão pleno da ânsia
do eterno desejo.
Que bom esse beijo...!
É dado com tempo,
de acender paixões,
despertando vulcões,
jamais esquecidos,
excitando libidos!
Adormecer lembranças. E nos fazer
amantes!
* * *
Poeta Luiz de Aquino
Coordenados
Corações cálidos no Equador;
cabeças em Europa; o teto
é geleira Groenlândia.
Nossos braços paralelos
enlaçam mundos de raças
e línguas.
Somos planeta
em translação ao sol
de Cupido.
Poeta Luiz de Aquino
A moça chegante
Vi chegar a moça de preto
A moça chegante
sorria ofegante e dizia o nome
Anamélia
ante a poesia de anestesia
rebrotada ao som dos passos.
Ansiei a alvorada
para não doer mais.